Desde o recreio que só penso em ti.
Tu és o meu príncipe encantado, fazes-me sonhar com dias cor-de-rosa, num palácio elegante onde seriamos 'felizes para sempre'. Gosto do teu sorriso, da forma gentil com que tratas as raparigas, não és como os teus amigos que nos estão sempre a tentar pôr gafanhotos nas costas ou apalpar o rabo quando corremos para a sala antes que soe o 2º toque. Gosto do teu cabelo espetado, dos teus braços magrinhos e dos teus olhos sinceros quando olhas para mim (porque me olhas assim?), e, claro, do teu fato de treino azul da Nike que os teus pais te trouxeram do estrangeiro. Ficas muito bonito, com o fecho todo corrido até ao pescoço, ainda mais bonito do que já és.
Nem consigo acreditar que hoje me deste este papelinho para a mão (eu vi a palavra amor riscada!)
ando a pensar se terás mesmo sido tu que o escreveste. Não que não te ache capaz, sei que escreves muito bem, conseguiste um 5 com o professor Artur (!) mas na festa da Ana, vi-te a dançar muito agarradinho à Marta e ela é muito mais bonita que eu. Tem um cabelo negro de índia, umas sardas lindas, e umas favolas muito redondinhas e brancas; além disso, usa vestidos da Migacho e dos Porfirios, sei que os rapazes estão todos pelo beicinho por ela.
Pergunto-me o que terás visto em mim?
Eu sou desajeitada, tenho o cabelo despenteado, quando me chamam nas aulas fico tão nervosa que não consigo dizer nada de jeito, nada do que penso. Outro dia a professora de inglês perguntou-me o que era um stick e eu atrevi-me a dizer toda entusiasmada que eram autocolantes! Já viste o disparate? Claro que pus a aula toda a rir, felizmente tocou para almoço e só tive de ouvir o kennedy e o andré a troçarem à saída. Mas o pior já estava feito: mostrei a todos a tonta que sou.
Diz-me: como podes gostar de mim?!
A única vez que um rapaz se declarou a mim, deixava-me bilhetes anónimos no estojo assinados com um K misterioso. Claro que pensei que era o Kennedy, mas afinal era o Miguel, a gozar comigo, a ver se eu aparecia nos encontros que ele marcava. Apareci em todos: atrás do pavilhão da ginástica, no bengaleiro do refeitório, no posto de enfermagem e até na sala do director. Ele fartou-se de rir às minhas custas, mas eu sou assim, tola, e acima de tudo, não deixo de ser curiosa. Imagina se estivesse mesmo lá alguém... imagina que eras tu, e eu não aparecia...?! Era como ter o cromo mais difícil da Sarah Kay e perder a caderneta!
E agora... este quadradinho de amor no pátio da escola.
Ainda não tive coragem de tirar o papel do bolso, tal o medo que as tuas palavras já não estejam lá, desapareçam por entre os meus dedos suados. Só quero chegar a casa para o guardar no cofre que o pai me deu, esperando que lá se conservem, as palavras e tudo aquilo que tu sentes por mim.
Até sermos crescidos e termos idade para um final feliz.